terça-feira, agosto 25, 2009

Desvio

I

Desejava o pai por perto
ainda sentia saudade
isso não era o certo
atravessaria a cidade
se ele era esperto
lembraria sua idade
ela não guardara rancor
no coração que não teve amor.

II

Sua mãe protestou:
- o quê ele fez por ti?
ela retrucou:
- antes, olhe para si
até hoje você só chorou
e sei que não está nem aí
os dois tem o mesmo defeito
estou cansada desse jeito.

III

Então ela partiu
sem medo do que encontraria
de repente sentiu um vazio
duvido que merecia
era final de abril
situação corriqueira do dia-a-dia
não receber um abraço
mas procurar o próprio espaço.

IV

Sem saber o que procurar
entrou num poço sem fundo
quem procura sempre vai achar
ela estava no submundo
uma luz foi lhe chamar
um velho bordel imundo
pegavam pessoas na rua
ela já se sentia nua.

V

Exposta na vitrine
enfrentando um tremendo frio
não estava de biquíne
uma garota lhe seguiu
seu nome era Aline
das mais belas, olhar febril
- aqui o dever é ser culta
e quando cobrada ir à luta.

VI

Terceiro dia que estava lá
um homem mais velho a procurou
ela não se calará
mas palavras lhe faltou
escolheram-na para atuar
ela foi com muita dor
o serviço ficou pela metade
não completaria tal maldade.

VII

O dinheiro a deixava feliz
era só o que importava
era como ser atriz
ela fingia, não amava
recebeu propostas para Paris
mas não era o que almejava
como foi parar nesse inferno?
talvez puxaste o lado paterno.

VIII

Fizera boas amizades
era considerada maluca
costumava passar as tardes
procurando novas perucas
era um fogo só, sem alarde
no chão colecionava bitucas
era seu novo vício
merecia esse hospício?

IX

Sua fama já era estadual
apesar das fantasias
tinha um próprio ritual
desconheciam por que o fazia
rebolado sensual
copiava da sua tia
adorava sentir dor
isso ela se acostumou.

X

Dez anos nessa vida
depois do pouco que fez
nunca teve a família unida
talvez numa próxima vez
as drogas criaram uma ferida
morreu aos vinte e seis
mas o homem mais velho ficou na mente
era o seu pai, o primeiro cliente.